Átila, o bom de braço

 

 

Conheci o Átila ali pelo início dos anos 1980. Lembro que tinha terminado um estágio no Jornal do Sports (o antigo Cor de Rosa, chamado pelos jornalistas de JS), mas não queria perder o contato com a rotina de jornalista. Então, saía da faculdade e ia até o antigo e modesto estádio do América Futebol Clube, no Andaraí – quase Grajaú ou Vila Isabel – e me encontrava com o amigo e colega Tino Marcos.
Tino era setorista do Mequinha (apelido carinhoso do time das camisas vermelhas e que naquele tempo era chamado de Grande) pelo JS e Átila cobria o mesmo clube, só que para O Globo. O camarada era magro, alto, com barba cerrada às vezes, mas tinha uma marca registrada: um sorriso permanente estampado no rosto amistoso. “E aí, camaradinha? Beleza”, “Fala meu irmão, tudo bom?” Saudava ela a todos, com a mesma alegria, respeito e a mão estendida para um cumprimento firme.
Enquanto os jogadores não entravam em campo, eu, ele e Tino ficávamos por ali, observando e batendo papo sobre Fórmula 1 (Depois conto a história da “Toleman”), futebol, tênis (Esse assunto ele dominava, pois fora quase jogador profissional, enfrentando até campeões de Grand Slam nos tempos de juvenis. Um eu me lembro: o equatoriano Andrés Gomez, que venceu Roland Garros em 1990) e música também. Levou um tempo, mas descobri que, além de soltar o braço nas quadras – principalmente no Tijuca Tênis Clube, pelo qual era apaixonado – Átila era baterista dos bons, roqueiro nato.
Daí eu comecei a chamá-lo de “bom de braço” (gíria que era usada para aqueles que brigavam na rua ou no colégio, batendo mais do que apanhava). Mas é bom explicar que este querido amigo só “descia o braço” com a raquete ou com as baquetas. Brigar? Jamais. Ele era 100% da paz e tranquilidade, resolvendo tudo na diplomacia.
Átila tinha um fusquinha invocado, bacana mesmo, que, como amante da F-1 e dos pilotos brasileiros, batizou de “Toleman” (1ª equipe do então jovem promissor Ayrton Senna). A gente brincava muito, ele sempre dizia que o carro era manhoso, que pegava quando queria, etc... E eu sempre dizendo que aquele fusca andava mais do que a Toleman real. Qual não foi a alegria dele, quando “ganhei” de minha mãe (participei com 20% do dinheiro, por isso as aspas) um fusca 1.300L, ano 1975, no início de 1984. Quando lhe contei, ele prontamente comemorou: Viva! A equipe Toleman está completa.
O tempo passou, eu virei servidor público federal e perdi um pouco o contato com o querido Átila. Depois soube que ele fora pra TV Globo, assim como vários colegas do jornal, pois o também saudoso Evandro Carlos de Andrade (ex diretor de redação do jornal) assumira a chefia do jornalismo da emissora e convidara vários talentos para o novo meio. E Átila se adaptou rapidamente, conquistando todo mundo. Não me lembro agora se, em minha primeira experiência em TV, no início de 1992 no esporte da Globo, ele já estava lá. Só sei que, depois de ficar 11 anos peregrinando por emissoras do país todo, eu voltei ao Rio e fui labutar no Sportv. A gente tinha contato esporádico, mas amigos verdadeiros não precisam se ver nem se falar todos os dias ou semanas – apesar que, cada vez, mais acho que devemos fazer isso sim.
Nosso contato sempre foi agradável, amistoso e cheio de energias boas. Quando ele veio pro canal (na Globosat a gente se referia assim, sem dizer o nome, ao canal onde trabalhávamos) eu fui pra São Paulo e quando voltei, quase um ano depois, ele já estava de saída de novo pro Jardim Botânico. Perdi a chance de conviver este tempo com um camarada nota 10.
Acompanhava suas postagens e suas poesias no Instagram e planejei ir a Itaipava vê-lo, lembrar os tempos do Mequinha e da Toleman. Mas não fui; fiz o maldito “outro dia eu vou”. Pois é. Acompanhei com tristeza e apreensão a notícia que ele descobrira um tumor no intestino. Ia passando força e recebendo notícias pelo whatsapp. A última vez que nos falamos foi em 7 de dezembro, ele contou que a Isabella, a amada mãe de seus filhos, levara o resultado de uma ressonância para o oncologista ver e marcar a cirurgia.
Não deu tempo. Neste 19 de janeiro, a doença que nos levou o Rei Pelé e o Roberto Dinamite, tirou de nosso convívio mais um craque: no tênis, na batera e no jornalismo. Uma última história: tempos atrás Átila se propôs a mais um desafio na vida. Ele assumiu uma casa noturna de boa música, rock ao vivo, raiz. Eu quis muito levar meu grande amigo Luiz Makarra, baterista da melhor qualidade, na casa da Rua do Riachuelo, para apresentá-los. Era um orgulho conhecer duas feras nas baquetas. Luiz partiu em julho de 2019, repentinamente, e agora Átila se foi.
Eu acredito em vida espiritual, mas como eles não se conheceram aqui no nosso planetinha, dificilmente vão se esbarrar na eternidade. Só se o Maestro Maior chamar os dois e falar: camaradas, o Yelmo, amigo de vocês, está meio triste lá embaixo. Façam um som legal aí pra ele.



 

Yelmo Papa - Jornalista.



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