O arquiteto Tiago Coutinho da Silva não esperava ser chamado ao palco durante o evento de lançamento do edital do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), no último dia 21 de março. Sentado na plateia com os pais e a esposa, foi surpreendido quando a diretora de Pessoas, Gestão e Operação do banco, Helena Tenório, anunciou seu nome:
“O primeiro colocado das cotas foi o primeiro colocado geral do concurso”, declarou a diretora.
Tiago disputou uma das duas vagas para arquitetos no concorrido concurso realizado pelo BNDES em outubro de 2023, após 12 anos sem seleções desse tipo. Apesar de ter optado pela reserva de vagas raciais, ele obteve a maior nota não apenas em sua carreira, mas entre todos os candidatos.
Emocionado, ele dividiu o palco com as ministras Anielle Franco (Igualdade Racial), Macaé Evaristo (Direitos Humanos e Cidadania) e Margareth Menezes (Cultura).
“Não estava preparado. É muito mais fácil fazer uma prova”, brincou, antes de afirmar que se sente “um exemplo de representatividade e motivo de orgulho e inspiração para outras pessoas”.
A aprovação foi resultado de anos de estudo. “Dedicação ao longo de uns anos já. Eu estudo desde 2020”, contou à Agência Brasil.
“Política de cotas é uma reparação para a gente tentar igualar as coisas”
Embora tenha se classificado também na ampla concorrência, defende as cotas raciais como uma política necessária para corrigir desigualdades históricas.
“Quando os brancos chegaram aqui, eles sempre tiveram essa oportunidade, eles receberam cotas de terra, receberam coisas que dão oportunidade a eles até hoje. Então, a política de cotas, na verdade, é uma reparação para a gente tentar igualar as coisas que já deveriam estar em um cenário melhor. É uma dívida. Um ponto que tenta igualar as diferenças que a gente tem na sociedade”, afirmou.
Ele credita seu sucesso também à base familiar e ao acesso a uma educação de qualidade. Estudou em instituições públicas de referência, como o Instituto de Aplicação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (CAp-UERJ) e a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Concorrência e política de cotas
O concurso do BNDES reuniu 42.767 inscritos para disputar 150 vagas imediatas. A maior concorrência foi justamente para arquitetura e urbanismo, com 2.362 candidatos disputando apenas duas vagas, uma proporção de 1.181 por vaga. Tiago alcançou 110,6 pontos, de um máximo de 120.
“Vai ter o crítico que diz que a prova deveria estar fácil. A gente colocou a prova para o ChatGPT, e ele tirou 82”, afirmou Helena Tenório. Segundo ela, o desempenho de Tiago demonstra que a política afirmativa do BNDES tem sido eficaz.
O banco adotou uma reserva de 30% das vagas para negros, acima do mínimo de 20% exigido por lei.
“O fato de a nota mais alta do concurso do BNDES provir de um candidato cotista reafirma o acerto da nossa decisão de fazer uma política afirmativa acima do limite mínimo previsto em lei. Optamos por uma cota racial de 30%, porque acreditamos que equipes mais diversas são não apenas mais representativas, mas também mais eficientes”, destacou a diretora.
Proposta para elevar percentual de cotas tramita no Congresso
A Lei 12.990/2014 reserva 20% das vagas em concursos públicos federais para negros. Atualmente, tramita no Congresso um projeto que busca elevar esse percentual para 30%.
No ensino superior, uma lei sancionada em novembro de 2023 determina que, no mínimo, 50% das vagas em universidades federais sejam destinadas a estudantes de escolas públicas. O texto também prevê atualização anual dos percentuais de cotas raciais e para pessoas com deficiência, conforme dados populacionais.
Para Tiago Coutinho, as políticas afirmativas cumprem um papel essencial na construção de uma sociedade mais equitativa. “É uma dívida histórica que o Brasil precisa saldar”, conclui.
Com informações da Agência Brasil
Para Tiago Coutinho, reservas de vagas corrigem déficits históricos e ampliam oportunidades a grupos marginalizados
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